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Exclusão de benefícios de ICMS da base do IRPJ e da CSLL a partir da posição do STJ

Exclusão de benefícios de ICMS da base do IRPJ e da CSLL a partir da posição do STJ

Por Tainah Mari Amorim Batista

Advogada

Godeghese e Silva Advogados Associados

Julho 2023

 

Foram publicados, no último dia 12 de junho de 2023, os acórdãos proferidos pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ, relativos ao julgamento do tema repetitivo nº 1.182 (Recursos Especiais nºs 1.945.110 e 1.987.158), onde concluiu-se que, com exceção do crédito presumido, a exclusão de benefícios e incentivos fiscais relativos ao ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL estaria condicionada ao atendimento dos requisitos previstos no art. 10 da Lei Complementar nº 160/2017 e art. 30 da Lei nº 12.973/2014.

No entanto, antes de adentrar na análise desse recente julgamento, é necessário traçar um breve histórico da discussão.

Em 2017, a 1ª Seção do STJ, por ocasião do julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial nº 1.517.492, consolidou entendimento no sentido de que os créditos presumidos de ICMS não poderiam integrar a base de cálculo do IRPJ e da CSLL por não caracterizarem lucro e que, além disso, a possibilidade de tributação nesse caso equivaleria permitir que União tornasse sem efeito o incentivo concedido pelo Estado, violando o pacto federativo.

Alguns meses antes, naquele mesmo ano, havia sido promulgada a Lei Complementar nº 160, que alterou o art. 30 da Lei nº 12.973/14, para estabelecer que os incentivos e benefícios fiscais de ICMS são considerados subvenções para investimento, para fins de não inclusão no lucro real, observados requisitos previstos em tal dispositivo legal.

Com a promulgação da LC nº 160/17, a União buscou obter um novo pronunciamento do STJ com relação à discussão envolvendo a tributação dos créditos presumidos de ICMS; no entanto, a 1ª Seção do STJ manteve firme o entendimento quanto à impossibilidade de inclusão do crédito presumido de ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, mesmo após o advento da referida lei complementar (AgInt do EREsp nº 1.462.237, AgInt nos EDv no EREsp nº 1.603.082 e EREsp nº 1.443.771).

Portanto, restava clara a posição do STJ no sentido de que os créditos presumidos de ICMS não poderiam compor a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, por não representarem lucro, independentemente das disposições do art. 30 da Lei nº 12.973/14 e da LC nº 160/17.

Por seu turno, o Supremo Tribunal Federal, em 2017, proferiu decisão afastando a repercussão geral e, por consequência, sua competência para julgamento da discussão relativa à inclusão dos créditos presumidos de ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, por entender que se tratava de matéria infraconstitucional (Tema 957 – Recurso Extraordinário nº 1.052.277).

A despeito da posição manifestada em relação ao crédito presumido, remanescia em discussão o tratamento a ser aplicado aos demais benefícios e incentivos fiscais de ICMS. De um lado, a 1ª Turma do STJ entendia pela exclusão dos demais benefícios e incentivos fiscais de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, em razão do pacto federativo, a exemplo do decidido em relação ao crédito presumido. De outro lado, a 2ª Turma se posicionava no sentido de que a exclusão estaria condicionada ao preenchimento dos requisitos do art. 10 da LC nº 160/2017 e do art. 30 da Lei nº 12.973/14.

No julgamento do Tema Repetitivo nº 1.182 prevaleceu o entendimento da 2ª Turma, sendo fixada a seguinte tese:

 

1. Impossível excluir os benefícios fiscais relacionados ao ICMS, – tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento, entre outros – da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, salvo quando atendidos os requisitos previstos em lei (art. 10, da Lei Complementar n. 160/2017 e art. 30, da Lei n. 12.973/2014), não se lhes aplicando o entendimento firmado no ERESP 1.517.492/PR que excluiu o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL.”

 

De acordo com os Ministros da 1ª Seção do STJ, diferentemente do crédito presumido, os outros tipos de benefícios fiscais de ICMS poderiam produzir o “efeito de recuperação”, de modo que não seria possível garantir que o imposto exonerado em uma determinada operação não fosse cobrado na operação subsequente, em razão da não-cumulatividade. Por tal razão, concluíram os Ministros que não seria viável a extensão do entendimento firmado no EREsp nº 1.517.492 (relativo ao crédito presumido) para outros benefícios e incentivos de ICMS, para os quais, a exclusão da base de cálculo do IRPJ e da CSLL está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos no art. 10 da LC nº 160/2017 e no art. 30 da Lei nº 12.973/14.

Em tal julgamento, foram ainda fixadas as seguintes teses:

 

2. Para a exclusão dos benefícios fiscais relacionados ao ICMS, – tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento, entre outros – da base de cálculo do IRPJ e da CSLL não deve ser exigida a demonstração de concessão como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos.

 

3. Considerando que a Lei Complementar 160/2017 incluiu os §§ 4º e 5º ao art. 30 da Lei 12.973/2014 sem entretanto revogar o disposto no seu § 2º, a dispensa de comprovação prévia, pela empresa, de que a subvenção fiscal foi concedida como medida de estímulo à implantação ou expansão do empreendimento econômico não obsta a Receita Federal de proceder ao lançamento do IRPJ e da CSSL se, em procedimento fiscalizatório, for verificado que os valores oriundos do benefício fiscal foram utilizados para finalidade estranha à garantia da viabilidade do empreendimento econômico.”

 

No item 2, consignou-se que, para exclusão dos benefícios fiscais de ICMS, não deve ser exigida a demonstração de concessão como estímulo à implantação ou expansão do empreendimento econômico. Surgiram, no entanto, dúvidas quanto à eventual incompatibilidade de tal item da tese fixada com o item 3, que determina que a dispensa referida no item 2 não impede a Receita Federal de promover o lançamento do IRPJ e da CSSL se restar comprovado que os valores relativos ao benefício fiscal não foram destinados para “garantir à viabilidade do empreendimento econômico”.

É necessário, no entanto, notar que as expressões “implantação ou expansão do empreendimento econômico” (item 2) não possuem o mesmo sentido de “garantia da viabilidade do empreendimento econômico” (item 3).

A União, todavia, através da PGFN, divulgou nota afirmando que “o valor correspondente ao benefício deve ter registro na reserva da empresa e posteriormente ser reinvestido na expansão ou implantação de um empreendimento”, o que não condiz com o texto do item 3 da tese fixada.

No entanto, há diversos trechos dos acórdãos proferidos pelo STJ que corroboram com a conclusão de que a referência aos requisitos legais do art. 30 da Lei nº 12.973/14 estão relacionadas ao registro dos valores dos benefícios e incentivos em reserva de lucro, conforme indicado em tal dispositivo legal. Nesse sentido, trazemos trecho do voto do Ministro Herman Benjamin, que, inclusive, propôs a inclusão do item 3 da tese fixada:

“Como se verifica do excerto acima, a inclusão do § 4º no art. 30 da Lei 12.973/2014 indica nítida intenção de forçar a equiparação dos incentivos fiscais, qualquer que seja sua natureza, à ‘subvenção de investimento’, exigindo como contrapartida que os respectivos valores sejam mantidos em conta de reserva no Patrimônio Líquido. Ao mesmo tempo, não se pode perder de vista que a menção à segurança jurídica qualifica a garantia de ‘viabilidade econômica’ dos ‘empreendimentos realizados’, o que sugere que o legislador intencionalmente não dispensou a verificação da destinação dada a esses valores, que precisam estar vinculados à viabilidade econômica do empreendimento.

Nessa linha de raciocínio, em análise mais aprofundada do precedente firmado no julgamento dos EDcl no REsp 1.968.755/PR – indispensável porque estamos a decidir, em sessão presencial, feito cujo julgamento encontra-se submetido ao rito dos Recursos Repetitivos –, considero que a manutenção da exigência de que os valores dos benefícios fiscais sejam mantidos em conta de reserva do Patrimônio Líquido da empresa conduz ao entendimento de que se preserva, ainda que em menor extensão, a ratio segundo a qual tais benefícios devem estar minimamente relacionados com a viabilidade do empreendimento econômico. Assim, eventual desvirtuamento, mesmo que posterior (por exemplo, utilização desse valor para aumento do capital social, com ulterior restituição ao titular das ações ou cotas empresariais), retirará, com base no § 2º do art. 30 da Lei 12.973/2014 (não revogado pela Lei Complementar 160/2017), a aplicação do regime jurídico estabelecido na LC 160/2017, rendendo ensejo à instauração de procedimento fiscalizatório tendente a submeter a quantia à tributação (IRPJ e CSSL).” (g.n.)

Nesse cenário e diante da distorcida interpretação dada pelo Fisco, assim que publicados, os acórdãos foram alvos de embargos de declaração, visando esclarecer pontos, dentre eles a extensão da expressão “garantia da viabilidade do empreendimento econômico”, além de obter a modulação de seus efeitos.

É relevante salientar que a divergência em debate se refere apenas aos demais benefícios e incentivos fiscais de ICMS, uma vez que, em relação ao crédito presumido de ICMS restou consignado expressamente a manutenção do entendimento adotado no EREsp nº 1.517.492, sem necessidade de observância dos requisitos do art. 10 da LC nº 160/2017 e do art. 30 da Lei nº 12.973/14, como destacou o Ministro Mauro Campbell em seu voto: “Em suma, ao crédito presumido de ICMS se aplica o disposto nos EREsp. n. 1.517.492/PR. Já aos demais benefícios fiscais de ICMS se aplica o disposto no art. 10, da Lei Complementar n. 160/2017 e no art. 30, da Lei n. 12.973/2014.”

Assim, em relação a exclusão dos valores relativos aos demais benefícios e incentivos fiscais de ICMS do lucro real, o STJ consolidou o entendimento no sentido da necessidade da manutenção das reservas nos termos preceituados pelo art. 30 da Lei nº 12.973/14, restando, entretanto, aguardar eventual esclarecimento no tocante ao sentido de “garantia da viabilidade do empreendimento econômico”, sem, ainda, descartar a possibilidade de o tema alcançar o Supremo Tribunal Federal.

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